Com 62 anos de idade, sendo metade deles dedicado à arte da palhaçaria, o artista Daniel Rocha viaja de Macapá, capital do Amapá, decidido a participar da programação da Pantalhaços em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.
A 8ª edição da Pantalhaços - Mostra de Palhaços do Pantanal - chegou ao fim, mas os ensinamentos e momentos vividos continuarão a reverberar entre os participantes e espectadores. A busca pelo conhecimento e a vontade de estar entre seus semelhantes trouxeram artistas de diversas partes do Brasil para Campo Grande, incluindo o baiano de nascimento e amapaense por opção, Daniel da Rocha, que há três décadas dedica parte de sua vida à arte da palhaçaria e ao teatro.
Daniel, conhecido como Palhaço Jacy Borrô, compartilhou suas impressões sobre a jornada, nada curta, do Estado do Amapá até o Mato Grosso do Sul. Isso porque de Macapá, cidade onde ele mora, são 3.368 km até Campo Grande. O que de carro dá quase três dias de viagem, tempo estimado de percurso de 59 horas.
"Foi uma viagem longa, mas cada quilômetro valeu a pena. Estar aqui e aprender com outros artistas é uma experiência única. A troca de conhecimentos e a energia desse lugar são indescritíveis", afirmou ele que não pisa em solo sul-mato-grossense há 13 anos. “Estive em Campo Grande em 2011 para uma apresentação teatral e, retornei por agora para a Pantalhaços, tenho duas irmãs que moram aqui, Luciana e Cristina, e aproveitei a oportunidade para estudar e matar a saudade”.
Insaciável por conhecimento como pede o ofício da palhaçaria, Daniel explica que já tinha engatilhado um curso no Estado de Rondônia semanas antes da Pantalhaços começar. “Marquei uma oficina de teatro na cidade de Pimenta Bueno. Aí, peguei um voo até Porto Velho, de lá fui de ônibus até Pimenta. Passado o curso, pensei no meu irmão que mora em Vilhena, que é uma cidade do mesmo estado, só que divisa com Mato Grosso. Aí quando eu cheguei lá, lembrei das minhas duas irmãs que moram aqui. Já tinha na cabeça o festival [Pantalhaços], a mostra, aí juntando com minhas irmãs, foi impossível não vir para cá”.
Fotos: Vaca Azul
Artivista da cultura em Macapá, Daniel conta que embora as duas capitais brasileiras estejam geograficamente distantes há sempre semelhanças quando o assunto é arte. “Lá, o único teatro público é o das Bacabeiras que está em reforma há quatro anos e deve ficar por mais dois anos fechado. Eu e minha esposa tocamos o Teatro Marco Zero, que é particular nosso, onde está instalado o nosso Grupo Teatral Marco Zero. Ele é o único teatro propriamente dito da cidade em funcionamento, no mais são espaços alternativos adaptados para vários tipos de arte”.
A história de Daniel se descortinou na Pantalhaços dentro da mesa redonda “O Fazer Artístico Pós-Pandemia e nos Novos Tempos”, como explica o ator, palhaço, produtor cultural e um dos coordenadores da mostra, Anderson Lima.
“Ele emocionou a todos com a sua história, passou por dificuldades financeiras na pandemia como relatou na nossa roda de conversa. Teve que fechar o teatro, ganha-pão da família, por um bem maior que é a vida. Aqui, não foi diferente entre os nossos artistas, foi um período terrível para todos e a cultura foi um setor muito castigado”, pontua Anderson que vê na retomada dos eventos a possibilidade para repensar o fazer artístico que “não pode esperar que só o poder público resolva os problemas. Estamos em um novo momento e a gente precisa debater para encontrar caminhos de se posicionar perante os desafios, e das oportunidades como as leis de incentivo e, também, dentro da nossa ação fazer com que isso seja mais justo, seja de fato inclusivo”.
E quando o assunto é abraçar os seus semelhantes, dando espaço para todos os que buscam a arte, seja no palco ou na plateia, Daniel deixa seu recado. “Fiz todas as oficinas, assisti praticamente todos os espetáculos e saio daqui alimentado de conhecimento, acolhido. Na roda de conversa, chorei quando me recordei do período da pandemia em que estivemos com o teatro fechado e só não passamos fome porque amigos nos deram o que comer. Essa união que tive em Macapá, senti aqui na Pantalhaços, claro, que em um contexto mais leve. Que venha novas edições”.
“O FIC [Fundo de Investimentos Culturais] da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul foi essencial para esta nossa oitava edição. As políticas públicas são essenciais para que possamos levar a arte e a cultura ao povo”, lembra Anderson Lima ao revelar que a meta para a próxima edição é “conseguir mais e novos financiamentos para que possamos descentralizar a Pantalhaços do centro da Capital e chegarmos à periferia. Nossa última edição foi em 2019 e, agora, retomamos. É um passo por vez e o próximo que, seja um pouco maior como o sapato do palhaço, e que a gente chegue também nos bairros”, diz com humor.
Pantalhaços – De 29 de maio a 2 de junho, a programação incluiu diversas oficinas de palhaçaria e uma maratona de espetáculos, 13 no total, que encantaram o público local e visitantes. A pluralidade das apresentações e a qualidade das oficinas reforçaram a importância cultural do evento, que se consolida como um espaço vital para a formação e a troca de experiências entre os artistas da área.
Quem quiser conferir como foram os cinco dias da mostra basta acessar o Instagram (@pantalhacos) ou o blog da Mostra https://pantalhacos.blogspot.com/. Organizado pelo Circo do Mato em conjunto com a Cia Flor e Espinho Teatro, neste ano o festival foi contemplado com recurso do FIC (Fundo de Investimentos Culturais), oriundo da FCMS (Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul), do Governo do Estado.
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