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Carta para minha família

Oi, pessoal. O setembro amarelo acabou, mas vamos lembrar que nossa empatia com o próximo deve ser o ano inteiro, caso contrário o movimento acaba perdendo o valor e se sendo hipocrisia. Minhas cartas, por enquanto, estão encerrando hoje, mas a qualquer momento o correio Aryana pode voltar! Fiquem espertos! 


O ano era 1996 quando minha professora pediu para eu desenhar minha família. Pois bem. Eis minha família na minha imaginação de seis anos de idade. Uma observação importante, por favor, não reparem nesses bonequinhos de pauzinhos de quem não sabe desenhar, naquela época não existiam tantos recursos gráficos e tantas opções de fotos para copiarmos. A verdade é que eu não possuo dons artísticos, infelizmente.


Quem me conhece, de cara vai saber quem é quem. No entanto vou facilitar para vocês. Da direita para esquerda: Tia Aninha (minha madrinha), minha mãe, eu, tia Vilma (irmã da minha avó e minha segunda mãe) e minha avó materna Gladys. Polêmica para uma imagem de família “tradicional” em pleno anos 90, eu sei. Mas de uma representatividade sem tamanho. 


Era esse meu normal, aliás, ainda é. Vou explicar o porquê. Minha avó, que Deus já levou para morar com Ele, foi uma avó presente de sua maneira, trabalhou muito para ajudar a criar os irmãos e os filhos. Tia Vilma adotou todos os sobrinhos como filhos, então ela é nossa mãezona. Minha madrinha uma mulher incrível, pela qual eu aprendo cada dia mais sobre a vida, e minha mãe que, mesmo não podendo estar presente muitas vezes, sei que seu amor por mim é infinito.

Bom, isso foi um breve resumo das mulheres pelas quais tenho orgulho e me inspiro. As mulheres que estavam ao meu lado o tempo todo, em todas as crises. No meio do caminho perdi a vó. Mas, ela cuida de mim lá de cima que eu sei. No meio do caminho também ganhei a Maria Eduarda.


Falar da Eduarda tem um sentido especial para mim. Há 12 anos recebi a notícia que não poderia gerar um filho. No mesmo período, recebi a notícia que a Maria Eduarda estava a caminho. Foram duas notícias opostas. Lembro de uma conversa que tive que com a tia Aninha e ela me disse: estou tão feliz por estar grávida e ao mesmo tempo triste por você. E eu disse para ela não se preocupar, que tudo tinha um motivo.

 Eu, particularmente, conheci um amor que não sabia que podia existir. Maria Eduarda não saiu de mim, mas veio para mim. Não como irmã mais nova, ou prima que é o que ela é. É mais que isso, eu sinto uma responsabilidade maior, não sei explicar.


Uma observação: não vou citar o nome de todas as pessoas da minha família que amo e me ajudaram na fase aguda, estou apenas fazendo um breve resumo das pessoas que habitam a mesma casa. Que estavam 24 horas comigo. Que vivenciaram cada detalhe. Que sofreram, lutaram, superaram, rezaram, enfrentaram juntos comigo tudo. Meu padrinho também esteve, da maneira dele, mas esteve. O Antônio tem seis anos, não entende. Só sabe que a “dinda” vai ao hospital às vezes e precisa de silêncio. Se eu fosse citar o nome de todos, ficaria horas aqui. Tem meus afilhados Luana e Gabriel, primos e primas. Tias e tios. Enfim, cada um sabe da importância em minha vida. 

Bom, a família de uma pessoa com depressão e que tenta suicídio fica devastada. É um alerta 24 horas. Quando não é um, é outro na vigília. Facas? Nem pensar. Objetos pontiagudos? Não. Tudo o que eu poderia usar contra minha vida, eles tiraram de vista. Mesmo assim eu achava jeito de me machucar. E isso não doía somente em mim. Doía neles também. Cada recaída minha, era como se fosse um “fracasso” deles. E não era. Mas, vai colocar isso na cabeça deles.


Minha família é minha base. Minha primeira crise de depressão forte, recordei esses dias com minha mãe. E disse que um dia a vi chorando tanto que resolvi procurar ajuda, não por mim, mas sim por ela. Porque eu não queria que ela sofresse daquela maneira. Se sentisse impotente daquela forma. E foi. Me tratei anos. Até que chegou ano passado.

As pessoas me perguntam: Aryana, qual foi seu gatilho? O que aconteceu para você cair desse jeito? E eu sempre dou um sorriso, balanço os ombros, algumas vezes meus olhos enchem de lágrimas, e falo: não sei.

Não sei realmente. Não sei qual foi o “meu gatilho”. Ou se sei, ele está bem escondido que ainda não o encontrei, mesmo com o tratamento. Mas está tudo bem. O que eu sei é que minha base, meu alicerce, minhas pessoas, não falharam. Não teve algo específico que alguém fez ou aconteceu. Não fui eu quem falhei também. Simplesmente aconteceu. E está tudo bem! 


O que quero deixar claro com essa carta é sobre a luta de uma família de uma pessoa com depressão. Minha mãe fez de tudo. Tudo o que ela podia e não podia ela fez. Desde segurar a minha mão até assinar o documento autorizando o ECT - Eletroconvulsoterapia. É a “lei da vida”, o filho enterra os pais, por mais que eu acredite que não terei forças suficiente se/quando esse dia chegar, e não o contrário. Minha mãe travou uma luta contra o tempo e contra o mundo. 

Ouviu de tudo: “Leva a Aryana em tal lugar”. “Faz isso com a Aryana”. “A Aryana precisa de tal coisa”. Conselhos não faltaram. Luta também não. Aliás, dela, da Tia Vilma e da Minha Madrinha. Minha madrinha me levava em todos os lugares que mandavam, mesmo eu muitas vezes, estando presente fisicamente, mas totalmente alienada. Ela chegava em casa sempre com um presente, tentando levantar minha autoestima, mas mesmo assim eu não dava  “moral”. Não era bens materiais que iriam me ajudar, mas confesso que depois de um tempo entendi os presentes e até desfruto deles. Todo tratamento alternativo que ela descobria, lá estava ela me levando. Tia Vilma rezava, conversava com Deus e pedia para Ele me ajudar, tia tem uma fé muito bonita, e toda noite antes de dormir me abençoa. 


Enfim... Era uma luta de todos. Absolutamente todos. Minha mãe saia para trabalhar e me deixava com a tia Vilma, ela por sua vez tentava de tudo para arrancar um sorriso de mim. Mas era difícil. A Maria Eduarda também tentava, esse ano até fez um desenho no meu aniversário para me animar. 


Não vou estender muito essa carta porquê essa é a carta mais difícil que poderia escrever, acreditem. Por mais que eu tenha me exposto, cutucado a ferida, feito o sangue voltar a escorrer, essa é a carta mais difícil, sabem por quê? 

Porque é difícil encontrar palavras para traduzir o quão grata eu sou por ter essas mulheres na minha vida. O quão grata sou por ter pessoas que nunca desistiram de mim, mesmo quando eu desisti. Mesmo quando eu não sabia qual caminho seguir, eu tive sempre mãos segurando as minhas, me guiando e não deixando eu cair totalmente. 


Por muito tempo não consegui tocar nesse assunto em casa. Na verdade ainda é um assunto complicado, mas hoje, elas sabem, elas sabem que são minhas inspirações diárias, minha força e minha visão de futuro, porquê sei que tenho elas, sei que tenho por quem e para quem lutar. 

Muito obrigada, meus amores. Eu amo muito vocês. Obrigada por me pegarem no colo e me fazerem cafuné, quando nem eu sabia que precisava de descanso! Muito obrigada ️


Escrevo sempre ouvindo música, e coincidentemente, quando estava escrevendo, de forma aleatória, entrou a música: Paciência do Lenine. É isso, temos que ter paciência, pois a tempestade não dura para sempre! (Sim, eu amo um clichê, eu sei). Espero ter ajudado alguém com esses últimos textos, semana que vem tem uma história linda para vocês! Segurem a curiosidade!


Até mais!



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