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Território Livre: Eu sou você - Minha experiência com cogumelo

As pessoas ficam impressionadas quando demonstro pouca fluência e afinidade com o assunto drogas. No entanto já experimentei algumas delas, porém com excesso de responsabilidade, pesquisando bastante e fazendo isso de forma ritualística e não apenas recreativa sem a noção do que pode representar um erro nessa equação.


O lance aqui é tentar não ser hipócrita, certo? Ou tentar ser o menos hipócrita que eu puder sobre assuntos diversos. Até porquê, tratar do assunto “drogas” deveria ser mais natural na sociedade tão dependente em que vivemos. Antidepressivos, refrigerantes, maconha, fast food, cocaína, cafeína, álcool... Uma infinidade de drogas para as quais existem leis, tabus, discursos e uma outra infinidade de opiniões a respeito.



O fato é que a gente vive dopado. Este ano parei de tomar antidepressivo, mas vou deixar esse assunto pra um texto exclusivo, pois foi uma luta bizarra contra a minha própria cabeça, lidando com minhas questões químicas cerebrais naturais em abstinência da droga e o medo de mim mesmo. Medo de não me reconhecer ou não gostar de mim sem ela. Uma parada bizarra, então fiquem ligados nos próximos textos.


Mas é da Psilocibina que quero falar. O cogumelo alucinógeno, como costumam chamar. Experimentei depois de muito tempo (em relação a amigos da minha idade) e tive uma experiência suigêneris a qual quero aqui narrar pra vocês.


Não sei por que razão eu tenho medo de ficar esquizofrênico, por isso não experimentei o cogumelo antes. Mas na verdade compreendi que meu medo não é de ficar esquizofrênico, e sim medo de perder o controle. O primeiro insight que o cogumelo me deu foi de que sou uma pessoa viciada em controle, então vamos elaborar um pouco mais a questão e a experiência.


Estava eu na casa de um amigo que compra esses cogumelos de forma legal pela internet embalados a vácuo. O congelador dele tem uma considerável quantidade de saquinhos de chimeji. Cada um vem com um pacotinho de sílica dentro, ao lado do simpático cogumelo desidratado. Pois bem, resolvi experimentar em uma noite, acompanhado desse amigo por quem tenho grande confiança, pois acredito que experiências de expansão da consciência ou a possibilidade de perder o controle devem ser em locais seguros e confiáveis, bem como ao lado de pessoas confiáveis, pro caso de dar merda.


Não comi tudo. Deixei uma perninha do cogumelo pro café da manhã, caso me desse vontade. Hahaha! Mentira! Me consultei com meu amigo psicólogo, músico e especialista em recuperação de dependentes químicos Claudio Loureiro, dizendo que eu queria experimentar, mas que tinha receio de perder totalmente o controle. Ele me perguntou como eu estava me sentindo (eu respondi que estava me sentindo bem) e me orientou a não comer tudo. A melhor orientação que alguém poderia ter me dado naquele momento. Deixei a perninha.


O lance não demora muito pra bater. Acho que em 20 minutos eu estava completamente fora da minha orbita normal. Fui entrando na atmosfera do Cogu aos poucos como em uma brisa de maconha, mas em um mix de conforto e desconforto que não é natural da maconha. A sensação é de que a gente vai deixando de ser a gente mesmo e passa a observar de fora depois de alguns minutos.


Essa sensação é acompanhada por uma instabilidade térmica no corpo, pois senti um puta calor conforme a onda foi se intensificando, porém em questão de segundos pintou um frio do nada daqueles que a gente procura um casaco.


A sensação de instabilidade é térmica e também mental. Senti meus pensamentos se acelerarem de uma forma impressionante, porém utilizando-se de uma inteligência que eu não havia experimentado. Sabe uma máquina de caça-níquel que você aperta o botão ou puxa a alavanca e as rodas ficam com imagens iguais ou diferentes? A sensação foi essa: Lembrei de quando eu era pequeno e meus pais iam pra balada e me deixavam com a Narcisa (nossa empregada doméstica) que ouvia louvores no radinho à pilha. Isso me causou angústia, mas uma angústia violenta.

Rapidamente muitas projeções a respeito desses episódios vieram à minha cabeça.


Em seguida, papo de dois minutos depois dessa elocubração, meus sobrinhos surgiram na minha cabeça e me trouxeram um conforto incrível junto à sensação de felicidade e ótima sensação térmica. Claque! outra rodada do caça-níquel e eu estava elaborando minha relação com meu pai e lamentando profundamente o fato de muitas vezes não ter muita qualidade de tempo dedicado à ele. Eu e esse amigo sempre verbalizando e elaborando juntos tudo o que estava aparecendo.


Claque! outra rodada de pensamentos e eu apareço chorando muito, pensando que a vida é um lugar onde ninguém gostaria de estar. A gente chega aqui em uma família, faz amigos, cria amores e depois tudo acaba no jogo sádico da “ordem natural das coisas”. Minhas lágrimas pareciam contas de missanga, caindo e fazendo barulho sólido e não líquido.


Corta para os amigos morrendo de dar risada na sala e observando o quanto a sala era bonita. As paredes aveludadas, tudo combinando em uma decoração que fazia total sentido. Sensação de conforto de novo nessa roleta russa de visões, sensações, felicidades e angústias. Puta que pariu, que viagem da porra! A morte da mãe veio em seguida. Cara, como a gente não quer perder a nossa mãe. Angústia violenta de novo.


Conversamos o tempo todo. Falamos, falamos e falamos sobre esses assuntos e eu me dei conta de que, no ápice das elaborações (já sem camisa com bastante calor deitado no sofá e ouvindo atentamente as infinitas elocubrações de quem havia comido o cogumelo inteiro) eu estava exausto. Meu amigo andava pra um lado e pro outro com sua máquina de caça níquel formando combinações e enrolado num cobertor. Parecia cena de filme.


Fui buscar na minha nécessaire instintivamente um óleo essencial de lavanda e sem pensar em nada comecei a massagear meu umbigo. Fiquei ali massageando meu umbigo por uns 40 minutos conversando mais lentamente sobre os assuntos da roda da fortuna de meu amigo, que também eram a minha. Eu sou você!


Conclusão da experiência: O bagulho é absolutamente imprevisível e incontrolável. Portanto, após todo esse sofrimento de angústias e felicidades, sensações térmicas e mentais alteradas, pude perceber onde o negócio atua. Consegui elaborar alguns dos assuntos do caça-níquel muito rapidamente. Algumas coisas que estavam pairando e me angustiando por alguns meses simplesmente desapareceram após a experiência. Fui atrás de me reconectar com meu pai e tentar reestabelecer um tempo de mais qualidade com ele, enterrei definitivamente uma angústia do fim de um ciclo da minha vida e passei dias serenos depois de muito tempo agitado.


Quero repetir a experiência? Não tão cedo. Pra mim não foi só ver cores alteradas e ficar dando risada atoa. Acho que tudo o que envolve o cérebro deve ser feito com parcimônia. Tudo é energia e o cogumelo abre o portal do nosso cérebro pra enxergar toda essa energia que a gente tanto fala. Trata-se de botar o ego pra descansar, despir-se diante da vida por algumas horas e aceitar. Aceitar que naquele momento, naquela hora e naquele lugar tá rolando uma faxina na sua mente, de que a gente é o outro e o outro é a gente.


Acho que em algum momento vou querer fazer faxina de novo, mas por algum tempo ainda vai reverberar a experiência... Onde será que deixei aquela perninha?

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